sexta-feira, 26 de março de 2010

Adeus




Adeus.
A pronúncia desta palavra sempre me sufocou os sentidos cada vez que me lembro do seu eco num quarto sem paredes, janelas…mas eu não me sentia presa. Era escrava da tua ausência, porque queria, porque gostava de viver debaixo do teu olhar, ouvir as tuas ordens e submeter-me ao teu respirar brando no meu queixo. O teu beijo sabia a sangue, como se ao tocar nos teus lábios me matasses de tanto desejo, como se toda a circulação sanguínea se concentrasse no calor do teu sabor. Estou morta, nua, e ninguém se preocupa com este cadáver à solta nas avenidas. Ninguém se apercebe do sangue que escorre pelos golpes por ti feitos, ninguém dá conta da palidez que assombra o meu rosto cavernoso, ninguém repara no vazio que me enlouqueceu. Ninguém vê, cheira, ouve, saboreia, sente a dor ardente que me corrói o peito em carne viva… E digo eu que o morto que perdeu os sentidos sou eu, quando ninguém consegue usufruir deles para se aperceber da loucura que me levou à cova. Não estareis também morto? O que é vida afinal? Quem nos disse a nós que a vida é isto? Não será isto a morte, não será isto uma preparação para a vida? É que afinal de tudo, eu sinto-me morta cada vez que inspiro e nem sequer desejei morrer, simplesmente já nasci sem alma… e o que é a alma afinal?

janeiro de 2010

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